Casa de Sil de Polaris

Porque não se fica velho duas vezes !!!

Nome:
Local: Brazil

Eu sou proprietária dessa casinha magnífica que tem sofrido reformas ... ^^

quinta-feira, 30 de setembro de 2004

Tem uma estante de livros e um revisteiro no consultório de minha médica ginecologista para oferecer um acervo variado às pacientes em sua sala de espera. Eram revistas sobre fofoca e sobre política em sua maioria, assuntos que ou não me atraem de imediato ou não me interessam por muito tempo, portanto resolvi escolher um livro como passatempo. Ela estava atrasada em seu atendimento, recém-chegada de uma cirurgia de emergência para uma cesariana.

Um livro sobre mitologia clássica teria assunto e detalhamento mais que suficientes para me entreter por algumas horas. Tinha meia dúzia de contos, cujos títulos não clareavam o tema logo à primeira vista às vezes. Li todo aquele livro, em três horas e meia. Era uma obra adaptada para adolescentes, escrita e publicada na década de sessenta, adaptada do original inglês, que foi adaptado de sua versão francesa, sob uma óptica huguenote.

Era uma narrativa tranqüila, com qualquer arroubo sob rédea curta, escrita para informar adolescentes sobre mitologia clássica, mas apresentada em uma linguagem repleta de moralidade da década de sessenta, com comentários e explicações puritanos para sacralizar qualquer manifestação helênica que pudesse ser considerada impura. Nunca poderia aceitar que um grego dissesse "deus seja louvado em sua glória eterna" ou que maldissesse feiticeiras como uma praga.

Isso era explicado pela origem de nascimento do autor original: Salem, cidade famosa historicamente por sua caça às bruxas, terror verdadeiro imposto à muitas almas pelos motivos mais absurdos e hipócritas, além de ignorantes. Fiquei analisando aquele livro a cada página conforme prosseguia minha leitura desde que surgiu o primeiro ponto de conflito entre leitora e leitura. Pelos deuses ! Que blasfêmia intensiva ! Tudo ficou comprometido !

Circe e Medéia eram feiticeiras muito famosas no contexto mitológico, capazes de muita argúcia, tanto para bem quanto para mal. Foram postas ali por ser impossível contar aquelas histórias antigas sem dar-lhes sua participação devida, mas eram descritas como serpentes perigosas, prontas a dar um bote fatal na primeira oportunidade que surgisse se o herói que serviu-se de seus talentos baixasse sua guarda fosse pela razão que fosse.

Perséfone era uma garota de seus dezesseis anos, personificação da primavera, quando foi seqüestrada por Hades, irmão de seu pai, portanto seu tio, que apaixonou-se por ela. Mas aquele livro apresentou-a como uma garotinha de dez anos de idade, levada pelo deus sombrio porque este queria alguém cheio de alegria, capaz de iluminar seu reino escuro com risos e travessuras, quando os propósitos do deus da morte eram voluptuosos como convém a um amante.

Demetér, mãe de Perséfone, foi apresentada como uma mãe em desespero profundo simplesmente, colocada como uma fazendeira dedicada ao extremo que pudesse arar o mundo grego inteiro para fazê-lo florescer. Ela foi pintada de uma forma muito menos persistente do que era em realidade. Zeus, deus supremo, pai de Perséfone, não foi citado uma vez. Todo desenrolar para desfecho da aventura ficou a cargo de Hermes apenas. Pôr Zeus em ação como ocorreu seria heresia.

Puseram nome errado naquele livro. Essas histórias são lendas e não contos. As aventuras de Ulisses foram uma odisséia, o que forma uma epopéia e não um conto, mesmo que tenham escrito parte dela apenas. Eram lendas cretenses, espartanas, tebanas e etc que tinham função educativa para formar caráter de jovens gregos, eivadas de símbolos humanos colocados no inconsciente coletivo da humanidade, que herdou lendas helênicas como base de sua cultura.

Foram sabotadas ao serem cristianizadas pelos huguenotes.

Inconcebível ! Aquelas lendas eram instrumento educacional humano.

Um legado tão lindo, criado ricamente a partir de fatos, estilhaçado.

0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial