Vim a pé para meu trabalho de manhãzinha para aproveitar aquele frescor matinal que existe em minha cidade entre seis e sete horas, caminhando por minha avenida preferida, quando comecei a ouvir vozes de homem e mulher em uma conversa estranha que parecia uma discussão constrangedora para ela e uma mostra de poder viril para ele. Mal compreendi suas palavras. O que mais chamou minha atenção foi perceber que eu andava e nunca alcançava quem conversava, sem ninguém adiante de mim.

Vim caminhando normalmente e então compreendi o que era. Um homenzinho, pouco mais baixo que eu, estava andando e parando de portão em portão, ficando escondido pelas folhagens que passavam pelas grades dos jardins das casas, fazendo cantadas horrorosas para mulheres de toda idade que estavam pondo lixo para fora ou regando plantas. Diminui meu passo para ver se conseguia livrar-me dele, esperando que ele fosse adiante por não haver mais portões onde parar, mas eu havia sido vista por ele.

Vim normalmente. Vi que ele havia parado, esperando que eu chegasse até ele, olhando para mim. Ouvi qualquer coisa sobre estar uma manhã linda para caminhar, com ele convidando a si mesmo para caminhar comigo para "fazer companhia pra uma moça bonita". Um cheiro forte de cachaça veio pelo ar até mim. Gostei menos ainda daquela situação que já não estava agradando nadinha desde que percebi aquele homem ali. Ishtar ! Confusão desse calibre às sete horas de manhãzinha é muito azar !

Vinha andando devagar, então parei. Falei a ele para seguir sozinho, fosse para onde fosse que quisesse ir, porque eu preferia caminhar sozinha. Ficou muito bravo, falando ofensas que não compreendi em 99% e não senti qualquer tristeza por isso. Resolveu dizer aquela frase masculina típica de paquerador barato que deu-se mal: "devia ficar feliz por eu cantar você porque quem você pensa que é, sua coisa horrível ?!" Eu fico zen nas horas mais estranhas. Ri para mim mesma: um baixinho desdentado estava desdenhando de mim. Deuses ! ^^

Vinha andando devagar. Pois continuei andando devagar enquanto vi-o partir muito bravo, dizendo e gritando desaforos à vontade para mim e para quem mais quisesse ouvir, trançando pé pelo caminho até dobrar uma esquina. Sorri quando vi que iria ficar sossegada pela minha avenida preferida até meu consultório. ^^